Aquele
não foi o meu melhor descanso. O sono veio acompanhado de pesadelos
sem sentido. Tentarei descrevê-los:
“Primeiro vi ‘Pedaço’ ele
estava próximo a um local alagado, parecia infeliz e tentava salvar
alguns girinos, seus filhos, que ele levava em seu papo, desejava
trocar a água para seus filhotes, mas a água estava contaminada e
os girinos morreram, chorou e muito bravo com algo mergulhou nas
águas. O que veio a seguir foi apenas lapsos, imagens sem sentido
algum, apareceu o imenso peixe mestre de ‘Pedaço’, cujo me
falaram se tratar de um Aboleth. Um elfo drow que sorria de maneira
sarcástica, um rei louco e por vim eu me encontrava em um corredor
escuro, ao fundo havia uma mulher que estava de costas para mim, me
aproximava lentamente e quando eu estava perto ela se virou
lentamente, percebi que ela não tocava o chão e não emitia sombra.
Aquela visão me perturbou. De alguma maneira sabia que ela não
estava lá, mesmo assim temia. Quando a vi senti meu coração gelar,
calafrios e desespero, não saberia dizer quem é, ou melhor saberia
mas não ouso dizer seu nome.”
"Câmara do grande faraó Tri
Kreen Rasth"
"Provedor, devorador; Uma lâmina
de dois gumes; As raças tentaram lhe impor volumes; aceitaram
receber sua dor; Insaciavelmente faminta; tem que ser eternamente
alimentado; De sede é extinta; ou teme ser exterminado"
Pelo menos sabíamos onde estávamos,
pois não havia tempo de pensar no que aquilo significava. Logo as
formigas começaram a invadir o lugar, junto a elas um homem apareceu
correndo entrando pela porta carregando muitas formigas, atrás dele
apareceu uma espécie de formiga gigante com símbolos dourados no
exoesqueleto. Não havia tempo de conhecer o homem que chegava, o
combate se iniciou. Erestor e Skadi analisavam o sarcófago
procurando uma saída, enquanto Theodore tentava espantar as
formigas, eu empunhei meu arco e disparei contra o Formian, este
atacava o novato enquanto ele tentava se livrar das formigas com
magias que não surtiam efeito. Após algumas flechas os deuses
sorriram para mim e o Formian foi derrotado, mas ainda restavam as
formigas, Theodore lançou uma das piras contra elas, o homem que
chegou jogou uma bolsa de cola nela, eu lancei uma tocha na entrada o
que conteve o avanço delas. Ainda restavam muitas, Skadi lançou a
tampa do sarcófago contra as formigas revelando um Tri Kreen
mumificado, pelo visto a muito saqueado pelo que pude constatar
depois. Ainda assim as formigas continuavam a ser um problema o homem
que havia chegado finalmente se libertou das formigas e conjurou
ratos para afastá-las. As formigas não passavam das chamas que
lancei na porta, mas estávamos presos ali.
Enquanto meus amigos olhavam o sarcófago
e constataram que ele possuía uma espécie de fechadura que poderia
ser aberta com adagas de marfim, uma estava em minha posse, um som
veio dos corredores, acreditei ser Regnar e chamei por ele sem
resposta. Logo surgiu um feiticeiro acompanhado de um ogro mago e de
um drow, lembrei-me de meus sonhos, mas permaneci em silêncio, não
gostei daquela visita. O novato teve tempo de se apresentar, seu nome
era Brayan e isso é tudo que me recordo sobre ele. O feiticeiro era
um Rakshasa, uma espécie de homem-tigre., seu nome era Kar,
apresentou seu companheiros, porém não recordo dos nomes. Segundo
ele já fazia dois anos que eles estavam no labirinto. E aquele local
era parte de Sigil, a cidade dos portais. Pelo que ele falou também
pude compreender que era um labirinto infinito e que tudo girava de
alguma forma em torno de sonhos. Eu permaneci em silêncio, pude
saber que ele não havia gostado de Erestor graças a uma magia
anteriormente conjurada para ler a porta desta sala. Kar parecia se
divertir em desiludir Theodore e estava interessado em Skadi e na
peculiaridade da elfa. Durante a conversa ele nos disse de uma
possível saída, depois disso ele se divertia em provocar aqueles
que lhe dirigiam palavras, por fim anunciou que poderia chamar
Cornugon, um mercador, segundo ele que poderia negociar a saída.
Como meus companheiros aceitaram a oferta ele partiu, não sem antes
olhar Skadi com olhos desejosos. Ficamos ali inspecionando a sala,
Theodore encontrou duas passagens próximas ao sarcófago, este pelo
visto funcionava como uma espécie de elevador. Não sabíamos como
fazer funcionar, supomos que necessitasse das adagas de marfim, mas
as outras duas estavam com Regnar. Enquanto discutíamos sobre nosso
próximo passo uma sensação desagradável e ameaçadora nos tomou.
O fogo da pira que restava se tornou revolto até riscar a parede do
fundo formando um pentagrama, na pira só brasas sobraram um cheiro
de enxofre veio antes de aquela criatura demoníaca surgir diante de
nossos olhos, era enorme e possuía asas de morcego, segurava um
tridente e quando seus olhos se abriram somente duas órbitas negras
eram vistas. Apresentou-se como Nergal, Cornugon soldado de Arvenus.
Confesso que congelei, o medo tomou conta de mim, nada consegui
falar.
Theodore logo foi dizendo que desejávamos
a saída daquele lugar, Erestor completou com o pedido que Regnar
estivesse bem e também fosse liberto, Theodore concordou, em
resposta Nergal disse “Sua alma pelo seu pedido”. Erestor
ofereceu a dele de imediato, mas o diabo estava interessado em
Theodore e este estava inclinado a aceitar. Por um momento pensei que
sairia dali, mas Theodore daria o primeiro grande exemplo de sua
burrice. Ele disse ao Nergal “Minha alma por Regnar agora”. Não
houve resposta, mas eu soube e pude confirmar mais tarde que ele
havia perdido a alma. Erestor exigia saber o porquê à alma dele não
servia. O Cornugon deixou Theodore de lado, este já estava perdido,
voltava suas atenções a Erestor quando o novato resolve o chamar de
“monstro” para ganhar a atenção. Eu descobriria naquele momento
que novatos não devem ser levados a sério e que é melhor ficar
longe deles, e se possível, os matar rápido ou rezar para que o
labirinto o faça. Eis que o diabo realmente ficou ofendido e eu que
já estava com medo vi que minha morte agora era inevitável. Mas o
novato se ajoelhou e implorou perdão de uma forma tão convincente
que acabou perdoado e Nergal disse que só negociaria com ele se ele
cometesse os sete pecados mortais. Novamente o Cornugon voltou às
atenções a Erestor e disse-lhe que se algum de nós o matasse ele
libertaria a todos. Depois disso foi embora e a pira restante na sala
voltou a se acender. Erestor exigia que um de nós o matasse, mas foi
ignorado, éramos companheiros e haveria um modo de escapar desse
tormento. Começamos a sair da sala, Brayan ficou por ali sentado, um
sorriso no rosto como se fosse o homem mais esperto do mundo, dizia
algo como “agora só falta luxúria e ira, eu não vou estou sendo
preguiçoso” e soltava risadas insanas, foi a última vez que o vi.
Notei que algo que fizemos disparou uma
armadilha, e tudo agora estava obstruído, só nos restou um corredor
e fomos por ali. Saímos em uma sala bonita, um espaço grande no
centro havia um fosso e três portas, uma em cada parede que havia no
local além do lugar de onde viemos. Todas as portas possuíam um
portal entalhado de forma magnífica. Senti que Erestor estava
diferente, sua aura agia de forma pacificadora, mas resisti ao
efeito. Eis então que outro humano despertava no local, estava um
pouco assustado, seu nome era Hartigan logo saiu a procura de
armadilhas, mas a burrice de Theodore já nos pregava uma nova peça.
Sem se preocupar o guerreiro saiu andando pela sala e pisou em uma
placa de pressão, ouvimos o som de pedra arrastando em pedra e Skadi
pode ver que algo subia pelo fosso. Já era tarde pra qualquer
cuidado e Hartigan inutilmente procurava armadilhas, eu e Erestor nos
afastávamos, do fosso surgiu um enorme golem de barro.
Rapidamente disparei contra ele com meu
arco, sem sucesso algum, Theodore tentou acertá-lo com sua espada e
surtiu um efeito mínimo, Erestor usou seus golpes para tentar algo
contra o monstro, sem efeito também, Hartigan tentou uma manobra,
mas errou o golpe. Skadi pelo visto sentiu o efeito da aura, Erestor
percebeu se afastando para o canto oposto ao combate. O golem agarrou
Theodore e lhe esmagou os ossos com uma força descomunal. Notei que
o guerreiro sofria e disparei novas flechas, sem efeito algum
novamente. Abaixei meu arco, Hartigan tentou mais um belo golpe mas
desequilibrado derrubou sua arma, Skadi finalmente se libertou da
aura, em um minuto era uma dama no outro a gigantesca força da elfa
fez-se sentir em um violento golpe com seu martelo o que admirou os
novatos. Sem saber o que deveria fazer gritei sugerindo a fuga,
Erestor me respondeu “Você é um bardo, faça o que vocês fazem”.
Eu estava assustado, mas guardei meu arco e peguei meu bandolim. O
monstro se preparava para triturar novamente Theodore que por algum
milagre conseguiu escapar todo sujo de barro escalou pelo braço do
monstro e deslizou pelas suas costas caindo em segurança do outro
lado. O monstro então decidiu que era hora de atacar Skadi, mas
falhou. Recebeu um revide violento do martelo da elfa. Theodore ainda
lhe deu mais uma boa espadada pelas costas.
O monstro já parecia bastante avariado e
ali estava eu com meu bandolim nas mãos e sem saber o que fazer,
estava tenso e comecei a tocar uma música para inspirar meus
companheiros. Este foi o primeiro verso: “Avante
guerreiro destrua o mal, seria perfeito uma espada vorpal”.
Quando notei o que cantava pensei “mas que porcaria de bardo eu
sou!” Erestor pareceu ter gostado, Theodore abandonou o combate pra
ir ver o que havia na outra porta. Pensei “mas que cara burro”.
Hartigan novamente errou seu golpe, Skadi sofreu um duro ataque do
golem que foi revidado com um belo golpe de baixo para cima que
acertou o monstro desfazendo em barro por onde o martelo acertava.
Uma sombra surgiu e veio na direção de Theodore, ouvi algo como
“Regnar vive, como prometido” daquele ser macabro, naquele
momento conclui o que eu havia pensado antes sobre o pacto com
Nergal. A sombra caiu aos pés do guerreiro. Continuei minha música:
“Nos labirintos profanos
encontramos a luz, guerreiro sua força a saída conduz”.
Bem agora eu achei que estava voltando a velha forma. Erestor tenta
conversar com a sombra que se assusta, ela tentou pegar Theodore que
se afastou. Hartigan então mostrou imensa habilidade, deslizou por
baixo da criatura enroscando sua corda nos pés do monstro, saiu do
outro lado e com um movimento rápido puxou as cordas tirando o
sustento do inimigo que tombou no chão, sacou sua lança e tentou um
belo golpe, mas acabou falhando novamente. Skadi deu um leve passo e
desceu impiedosamente seu martelo contra o monstro que não resistiu
e sucumbiu ao poderia da elfa se desfazendo em poças enlameadas de
argila. Mas uma vez eu estava a salvo, naquele momento eu soube que
deveria compor algo em homenagem àquela maravilhosa, e peculiar,
elfa.
Em seguida todos pareciam cansados,
guardei meu bandolim e me lembrei da pequena Aya e da varinha que ela
me deu, a procurei em minhas coisas e descobri ser uma varinha de
cura, fiquei feliz por isso. Hartigan desarmou as armadilhas que
havia no local. Theodore insistia que em uma das passagens havia um
poço com água. Após alguma conversa fomos por ali, Hartigan na
frente. Descemos por uma escada no final dela havia um corredor
repleto de heras, no meio deste local um poço emitia uma luz mágica,
o calor da luz parecia agradar as plantas, havia água e esta
evaporava deixando um cheiro agradável de orvalho no ar. Hartigan
entrou no corredor das heras e antes mesmo que pudesse dizer algo uma
das plantas o “fisgou” e começou a sufocá-lo, novamente
estávamos sobre ataque. Erestor tentou golpear alguma das vinhas que
nos atacavam, assim como Theodore, uma das plantas fisgou Theodore.
Eu estava ainda na escada e atirei contra uma das plantas, não sei
dizer o porquê, mas minha flecha a matou instantaneamente. Skadi
estava estranha, parecia cansada, mas ainda assim conseguiu libertar
Theodore, com um movimento rápido Hartigan também se libertou e
tentou atacar falhando vergonhosamente, Erestor acertou uma das
vinhas que caiu.
Nesse momento um bastão de fumaça
passou sobre minha cabeça e caiu no centro da sala, o lugar ficou
tomado pela fumaça negra e intoxicante em segundos, pequei a varinha
de Aya e a usei em mim. Os outros vieram de volta para a escada,
Theodore ao chegar sacou sua besta e apontou para cima, só então
percebi que um drow estava ali, curiosamente era o mesmo que estava
com Kar, o Rakshasa. Meus instintos me fizeram temer. Mas o que
seguiu foi uma conversa que não pude compreender, Hartigan falava
como o drow em élfico pelo que pude notar, a meu ver em tom
ofensivo, eu e Erestor tentávamos pedir que ele intermediasse
algumas perguntas, mas ele mal nos deu atenção. Vi que Theodore
abaixou sua besta e a guardou. Hartigan falava que o drow nos
ofendia, eu estava confuso. Quando percebi o que estava acontecendo
eu havia acabado de conjurar uma magia que me permitia conversar com
o drow, mas seria inútil. Theodore nos deu mais uma de suas inúmeras
demonstrações de burrice.
Sem avisar ninguém o guerreiro retornou
até o poço para tomar água, eu penso escrevendo isso, “será que
um lutador experiente acreditaria que uma fumaça acabaria com nossos
inimigos?” a resposta provavelmente é não. Uma vinha o fisgou e
numa demonstração de sagacidade desmedida Hartigan correu até ele
só para também ser fisgado, Erestor tentou ajudar Theodore sem
muito sucesso, Skadi também falhou nisso e eu tentei pedir ajuda ao
drow, que foi logicamente negado, afinal quem ajudaria alguém que
minutos antes mirava um dardo em sua direção. Enfim corri até a
sala para presenciar o desacordado Theodore e o curei com uma magia,
ele acordou, mas ainda estava preso, Skadi tentou liberta-lo e
conseguiu. Theodore voltou para a escada, eu via agora que Hartigan
estava desacordado, em desespero tentei com todas minhas forças
libertá-lo, fracassei, mas Erestor o fez e após isso um dardo
envenenado disparado pelo drow acertou a vinha que morreu pouco
depois. Conseguimos escapar. Já em segurança na escada tratei dos
feridos com a ajuda do presente de Aya enquanto agradecíamos ao
drow. Agora eu conversava com o drow. Ele me contou que estava ali
atrás da honra de sua família, também falou que procurava por seu
pai. Minhas memórias logo me revelaram que ele se referia ao drow
que encontramos no início disso tudo, já morto pela mesma armadilha
que encontramos ao entrar nesse labirinto. Ele me perguntou da
armadura e eu lhe contei o que havia acontecido, falei que a demos
para a hobgoblin, fui honesto com ele não era meu desejo mentir
sobre aquilo. Falei da aranha que Erestor encontrou, o drow se
aproximou, mas a aranha também o rejeitou. Ele parecia triste com as
coisas que falei, mas tentava ocultar os sentimentos. Mas também me
pareceu um bom amigo. Perguntei seu nome, afinal não me recordava,
mas ele somente me disse que vendeu o nome para que pudesse encontrar
a armadura de seu pai. Aquilo me soou estranho, tive medo que isto
pudesse ser mais algum negócio com o terrível Nergal, mas
silenciei. Apenas pedi auxílio para que pudéssemos encontrar um
local para descansar e sugeri, a pedido de meus amigos, que ele nos
acompanhasse. Ele aceitou a companhia, disse também que havia
abandonado Kar por não gostar deles, apesar de achar tudo curioso e
um pouco mal contado, a oferta de um local para descanso me agradou
bastante. Seguimos com ele e acabamos por voltar a tumba do Tri
Kreen. Ali descansamos. Hartigan generosamente me cedeu comida, fato
que agradeço muito, eu estava cansado e faminto, mas depois que comi
me senti melhor. Todos já dormiam e eu ainda estava absorto em meus
pensamentos, o drow fazia a guarda. Lentamente o sono me dominou,
rezei aos deuses que me privassem dos sonhos.
Por Rodrigo de Souza
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